Cordéis... lírios... delírios... cor de lírios... Ou apenas mais um lugar (comum?!) onde dou vez e cor aos meus delírios!

domingo, 30 de outubro de 2011

Metáfora - Gilberto Gil

Uma lata existe para conter algo
Mas quando o poeta diz: "Lata"
Pode estar querendo dizer o incontível
Uma meta existe para ser um alvo
Mas quando o poeta diz: "Meta"
Pode estar querendo dizer o inatingível

Por isso, não se meta a exigir do poeta
Que determine o conteúdo em sua lata
Na lata do poeta tudonada cabe
Pois ao poeta cabe fazer
Com que na lata venha caber
O incabível

Deixe a meta do poeta, não discuta
Deixe a sua meta fora da disputa
Meta dentro e fora, lata absoluta
Deixe-a simplesmente metáfora

domingo, 23 de outubro de 2011

Nau dos loucos



O bilhete da viagem
  é imposto por sanção,
por um médico ou grupo,

"expurgando" a nação.
Eram todos ob(de)jetos,
corpos em putrefação:

“Todos a bordo agora,
  a nau logo vai partir.
Não se precisa de malas,
nem destino pra seguir.
O destino a Deus pertence,
cabe a Deus decidir

‘A sorte está lançada’,

no mar que é tão selvagem,
embora os tripulantes
sejam mais com grande margem.
Cairão alguns nas águas
outros tantos pela vargem.

Chegada a hora de ir,

viajarão sem razão.
É sua forma de viver,
  é assim que eles são”
Diz um médico francês,
imponente figurão.
 
Curiosos amontoam-se,
em cima daquela ponte,
observando eles partirem
sumindo atrás do monte.
E a nau que segue cega
(es)vai-se no horizonte...

Kércio Prestes

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Sem título


"Qualquer/ Traço, linha, ponto de fuga/ Um buraco de agulha ou de telha/ onde chova.
 Qualquer pedra, passo, perna, braço/ parte de um pedaço que se mova.
 [...] Qualquer curva de qualquer destino que desfaça o curso de qualquer certeza/ Qualquer coisa/ Qualquer coisa que não fique ilesa/ Qualquer coisa/ Qualquer coisa que não fixe." (Arnaldo Antunes, Hélder Gonçalves, Manuela Azevedo)


Essas linhas mal escritas
carecem de movimento,
ficam sempre a girar,
parecido um catavento,
feitas de “palavras-água”
nunca de cal e cimento.

Não podem se fixar,
são lírios sem raízes,
que voam com o vento,
não se prendem ao que dizes.
Nem tampouco representam,
pois são péssimas atrizes.

Nem procure por tesouros...
No fundo dessa lagoa,
talvez só encontre lodo,
lixo e coisas à toa,
quando muito uns destroços,
avião que já não voa.

Mas caso encontre algo,
não vá logo achando.
Pois que ache, tudo bem,
mas não fique enterrando.
Deixe que voe ou rasteje
por aí perambulando...

Deixe que voe em delírios
pervertendo as fronteiras,
caçoando teorias,
caçando outras besteiras.
Criando lugar comum,
sendo sempre forasteiras...

E ao sentir que achou,
que não firme sentido,
haverá algo surgindo,
que já é desconhecido
e que 




Kércio Prestes

quarta-feira, 30 de março de 2011

Procura da poesia¹

"Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio."

 
Carlos Drummond de Andrade

¹Fora reproduzido aqui apenas um trecho deste poema.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Das Belezas da Ferrugem¹

(Foto do muro-mural de minha casa)
Contornando todo o ferro
a beleza da ferrugem.
Cicatrizes, impressões,
ao longo do tempo surgem.

Com relevo específico,
sobressaltos que lhe urgem.


Mostra o ferro num canto...
Um tanto gasto, curtido...
 Mas  ali alguém inventa,
e dá-lhe novo sentido.
Em eternos descontínuos,
já não é  o que tem sido...

Beleza do transitório,
há devir, mas não dever.
 Do que só é quando sendo,
é um é sem querer ser.
Que é tão belo quando
se inventa no transver
.

Transformado pelo ar,
ganha cor do invisível.
Do tempo, esse pintor,
meio incompreensível,
que altera o que imaginar,
não há nada impossível.


Subverte-se as coisas
até então esclarecidas.
Com a leveza do ar
  a rigidez é esculpida.
Questionando-se o peso
  e outras tantas “medidas”.

A ferrugem é metáfora
das relações que implica.
Com o contato com outro
um pouco dele ali fica,
recebendo também um tanto,
já também se modifica

Mas não seja inocente
 aqui também há perigo,
 não se pode distinguir
 entre bom ou mau, amigo.
São apenas uns delírios
 que eu trago cá comigo...

¹Cordelírio criado após breve contato com as invencionices de Manoel de Barros.

segunda-feira, 14 de março de 2011

Dor Gravada - Patativa do Assaré


Gravador que estás gravando
Aqui, no nosso ambiente,
Tu gravas a minha voz,
O meu verso, o meu repente
Mas, gravador, tu não gravas
A dor que o meu peito sente!

Tu gravas em tua fita
Com a maior perfeição,
O timbre da minha voz,
A minha fraca expressão
Mas não gravas a dor grave
Gravada em meu coração!

Gravador, tu és feliz!
E - ai de mim - o que será?
Bem podes ter desgravado
O que em tua fita está.
Mas a dor do meu coração
Jamais se desgravará!

sexta-feira, 11 de março de 2011

Sobras do cordel anterior


Cantadores,
são encantadores,
Enquanto encantam o sertão,
cantam suas dores.
Com versos e conversas,
contam a paixão
de rimar seus versos,
de cheirar suas flores,
de cantar regressos e partidas
à terra dos seus amores.


sexta-feira, 4 de março de 2011

À todos os cantadores



À todos os cantadores

Aqui na terra rachada,
na quintura do verão,
menestréis sertanejos
brotam do árido chão
implorando por chuvas
com a viola na mão.

São nossos grandes poetas,

os maiores do lugar,
que batalham nas pelejas
com as violas a tocar.
Dominam a poesia
sem nem mesmo estudar

É a manha sertaneja,
de todo bom nordestino
que fala quase cantando
desde muito pequenino.
Que canta sua alegria
e também seu desatino.

Patativa, Zé Limeira
são alguns dos nossos astros,
Não tão populares quanto:
Olavo, Drummond e Castro,
                mas com versos tão sinceros               
   deixaram também seu rastro.

A vocês peço licença,
pra tentar também rimar.
Peço-lhes ainda a bênção
pra poder me ajudar.
Pra vencer muitas pelejas
  e cantar meu Ceará.

  Todos vocês que inspiram
  outros tantos cantadores,
que divulgam esta arte
  pintando varais de cores,
  a vocês todos eu peço:
- Cantem aonde fores!
 
Kércio Prestes